Imersão Iminência: Relato Crítico-Sensível

Este projeto nasceu da vontade de expandir os limites de nosso conhecimento sobre a produção audiovisual paulista contemporânea. Nós, criadores do coletivo Iminência, estudamos e nos profissionalizamos na capital, e uma vez tendo retornado às nossas cidades de origem buscamos cavar fundo perto de nossas raízes. Em um primeiro momento, éramos dirigidos pela expectativa de que o modelo de organização em torno de coletivos teria sido incorporado pela produção audiovisual no interior, uma vez que sua presença estava consolidada em outras linguagens artísticas. No entanto, durante a elaboração do projeto, percebemos uma dificuldade em localizar os grupos. Várias hipóteses podem ser levantadas para esta questão, desde a falta de uma publicização efetiva dos trabalhos até a dificuldade para os grupos manterem uma agenda permanente de encontros em uma localidade sem incentivos para o aperfeiçoamento técnico e artístico. No entanto, ficamos felizes com nossas escolhas uma vez que os os coletivos que participaram conosco neste projeto apresentam grande diversidade em seu modo de produção, nos resultados artísticos e também em seu diálogo com a sociedade. Desta forma, submetemos e fomos contemplados pelo Programa de Ação Cultural com um projeto de aprimoramento técnico-artístico que visava estabelecer diálogo com estes coletivos - que admiravamos à distância - e colocar em perspectiva nossa formação no audiovisual a partir do contato com estas experiências tão distintas.

Após doze meses de trabalho, tendo estreitado relações com quatro coletivos e dezenas de produtores e produtoras audiovisuais do interior do estado, fomos remetidos àquela questão inicial sobre a presença dos coletivos nas regiões externas à capital. Se por um lado é complicado implementar um trabalho de longa duração, por outro os grupos que persistem demonstram uma capacidade criativa relevante, colocando a capacidade de invenção à serviço de sua continuidade. Os coletivos Kino-Olho, Percurso Audiovisual, 308 e Estamira organizam-se de formas completamente diferentes, todavia mantém em comum a capacidade de moldar as relações de trabalho e criação para o conjunto de seus participantes. É interessante notar que estes grupos não tinham notícias uns dos outros e, a rigor, também não mantinham contato com coletivos audiovisuais de outras cidades. Muitas vezes sua formação foi calcada na experiência de grupos atuantes em outras linguagens (em geral, de teatro), emprestando inclusive participantes, equipamentos e espaço de reunião. De forma que, na ausência de maiores tradições em que se fiar, a sobrevivência dos coletivos audiovisuais no interior do estado exige experimentação constante. Nossa preocupação foi, além de simplesmente aprender, registrar essas experiências e comunicá-las aos outros pontos da rede para que os cinco coletivos envolvidos no projeto (um proponente e quatro participantes) pudessem aproveitar as lições colhidas para aperfeiçoar-se técnica e artisticamente. Vamos a uma breve descrição destes aprendizados:

O coletivo Kino-Olho está ativo há uma década em Rio Claro. Em seus primeiros anos, funcionava de forma independente, baseado em oficinas de cinema e vídeo ministradas pelo João Paulo Miranda Maria em centros culturais e escolas da região. Com o passar do tempo a atividade foi reconhecida pela prefeitura do município que passou a subvencionar o coletivo com financiamento e estrutura. Nos últimos cinco anos o coletivo contou com sede e renda fixa tendo formado dezenas de pessoas através de seus encontros semanais. Seu resultado mais expressivo foi a consolidação de um núcleo de produção profissional do Kino-Olho, que tem realizado curtas-metragens ficcionais que alcançaram estrondosos reconhecimento crítico, tendo frequentado o Festival de Cannes nos últimos três anos. O coletivo Percurso Audiovisual iniciou suas atividades na região de Sorocaba também com oficinas de cinema e vídeo, no entanto seus principais integrantes direcionaram as pesquisas para o campo multimídia. Embora tenham sido subvencionados pela prefeitura de Votorantim em seu primeiro ano, há dois anos realiza encontros semanais em Sorocaba, sem sede ou renda fixa. O coletivo sobrevive economicamente da realização de projetos e participado de exposições voltadas às artes visuais, tendo sido finalista do prêmio Flávio Gagliardi na categoria de instalação audiovisual em 2016. Suas pesquisas na área de cinema expandido levou o coletivo Percurso Audiovisual a colaborar com inúmeros artistas locais, cedendo partes de suas obras para a realização de cenários para fotografia e teatro. O coletivo 308 é um coletivo artístico guarulhense que realiza atividades de diversas linguagens artísticas em sua sede fixa. O grupo que dedica-se às atividades audiovisuais tem por responsabilidade registrar encontros e festivais realizados pelo coletivo, mas também goza de autonomia para produzir obras próprias. Esta parcela audiovisual do 308 é ativa em relação às políticas públicas de cultura do município e produz com maior constância video-clipes e curtas-metragens. Finalmente, o coletivo Estamira aprofunda-se na idéia do happening, a fim de igualar o estatuto da produção artística com a vida. Suas atividades não têm regularidade, embora possuam sede fixa em Santo André. Passeiam pela literatura, música, dança e audiovisual. Todos estes coletivos variam de tamanho ao longo do ano, podendo passar de uma dezena de membros ativos de acordo com o projeto.

Queremos finalizar destacando a importância destes intercâmbios para todos os grupos que foram contatados, uma vez que suas experiências locais levaram-os por caminhos distintos, muitas vezes inspirados em grupo de outras gerações e linguagens artísticas, pois nesta oportunidade pudemos realizar trocas entre pares da mesma geração e interesse de linguagem. Está claro que manter a atividade audiovisual afastada do centro econômico e político apresenta desafios em relação à permanência e continuidade dos trabalhos, no entanto possibilitam pesquisas heterodoxas emergirem.